Tempo de dar prioridade à justiça social

Comunicado de imprensa | 1 de Maio de 2023
O 1º de Maio é amplamente reconhecido como o Dia do Trabalhador, um dia em que comemoramos a contribuição dos trabalhadores e das trabalhadoras de todo o mundo. É um momento de orgulho, celebração e esperança.

Após três anos da crise da COVID-19, seguidos de inflação, conflitos, crises energéticas e alimentares precisamos muito desta celebração. Mas as promessas de renovação feitas durante a pandemia, de "reconstruir melhor", não foram até agora cumpridas para a grande maioria dos trabalhadores e trabalhadoras a nível mundial.

Globalmente, os salários reais diminuíram, a pobreza está a aumentar e as desigualdades parecem estar mais enraizadas do que nunca.

As empresas têm sido duramente atingidas. Muitas não conseguiram lidar com os efeitos cumulativos dos recentes e inesperados acontecimentos. As pequenas e microempresas foram particularmente afetadas, e muitas cessaram a sua atividade.

As pessoas sentem que os sacrifícios que fizeram para lidar com a COVID-19 não foram reconhecidos, e muito menos recompensados. As suas vozes não se fizeram ouvir com clareza. Este sentimento, combinado com uma percepção de falta de oportunidades, gerou um nível perturbador de desconfiança.

Não tem de ser assim. Continuamos a ser nós quem decide o nosso destino. Mas se quisermos moldar um mundo novo, mais estável e equitativo, temos de escolher um caminho diferente. Aquele que dê prioridade à justiça social.

Acredito que isto não só é possível como essencial para um futuro sustentável e estável. Mas como é que lá chegamos?
Antes de mais, as nossas políticas e ações devem ser centradas no ser humano, para permitir que as pessoas procurem tanto o seu bem-estar material como o seu desenvolvimento espiritual em condições de liberdade e dignidade, segurança económica e igualdade de oportunidades. Esta abordagem não é nova, foi estabelecida e acordada no rescaldo da Segunda Guerra Mundial, quando os membros da OIT assinaram a Declaração de Filadélfia em 1944.

Este documento visionário estabelece princípios orientadores para os nossos sistemas económicos e sociais, que não devem ser orientados exclusivamente para alcançar taxas de crescimento específicas ou outras metas estatísticas, mas para responder às necessidades e aspirações humanas. Isto quer dizer que nos devemos focar nas desigualdades, na proteção social de base e na redução da pobreza. A forma mais eficaz de o fazer é proporcionando empregos de qualidade para que as pessoas se possam sustentar e construir o seu próprio futuro - "Trabalho Digno para Todas as Pessoas", desígnio do 8º Objetivo de Desenvolvimento Sustentável.

Significa abordar de forma realista as transformações estruturais de longo prazo do nosso tempo; assegurar que as novas tecnologias criam e apoiam o emprego; enfrentar proativamente os desafios das alterações climáticas e assegurar que oferecemos os empregos, formação profissional e apoio à transição necessários aos trabalhadores e trabalhadoras e às empresas de modo a beneficiarem da nova era de baixas emissões de carbono; tratar as alterações demográficas como um "dividendo" em vez de um problema, com medidas de apoio que abarquem as competências, as migrações e a proteção social, no sentido da criação de sociedades mais solidárias e resilientes.

Precisamos também de reavaliar e reformular a arquitetura dos nossos sistemas sociais e económicos, para que apoiem esta mudança de rumo no sentido da justiça social, em vez de continuarem a canalizar-nos para uma “espiral fatal” de desigualdade e instabilidade. Temos de revitalizar as instituições e organizações do trabalho para que o diálogo social seja eficaz e vigoroso. Temos de rever as leis e regulamentos que afetam o mundo do trabalho, para que sejam relevantes e atualizados e capazes de proteger quem trabalha e apoiar as empresas sustentáveis.

Para que tudo isto aconteça, temos de nos comprometer novamente com a cooperação e solidariedade internacional. Devemos intensificar os nossos esforços e criar uma maior coerência das políticas, particularmente no âmbito do sistema multilateral, como tem assinalado o Secretário-Geral das Nações Unidas, António Guterres.

É por isso que precisamos de uma Coligação Global para a Justiça Social. Tal Coligação permitirá criar uma plataforma facilitadora da colaboração de um conjunto amplo de organismos internacionais e partes interessadas. Ao mesmo tempo, posicionará a justiça social como a pedra angular da recuperação a nível mundial dando-lhe a prioridade necessária nas políticas e ações nacionais, regionais e globais. Em suma, garantirá que o nosso futuro seja centrado no ser humano.

Temos a oportunidade de transformar o mundo em que vivemos nos planos económico, social e ambiental. Aproveitemos esta oportunidade e avancemos na construção de sociedades equitativas e resilientes que prossigam uma paz duradoura e a justiça social.

Gilbert F. Houngbo, Diretor-geral da Organização Internacional do Trabalho

Publicado em 1 de maio no Diário de Notícias