América Latina e Caribe

Informalidade e não cumprimento de leis atrapalham o progresso regulatório de 14,8 milhões de trabalhadoras domésticas na região

Na América Latina e no Caribe, 4,1 milhões de trabalhadoras domésticas podem efetivamente acessar seus direitos e proteções de fato. Dezoito dos 35 países do mundo que ratificaram a Convenção nº 189 da OIT sobre trabalhadoras trabalhadores domésticos, adotada há uma década, são desta região.

Notícias | 17 de Novembro de 2021
Lima - As condições do trabalho doméstico na América Latina e no Caribe avançaram desde a aprovação da Convenção Nº 189 da OIT, há uma década. Mas os dados mais recentes indicam que há um longo caminho a percorrer em termos de formalização e aplicação efetiva das leis.

Das 14,8 milhões de trabalhadoras domésticas contabilizadas na região em 2019, 72,3% não têm acesso a um emprego formal. Para 725.000, os níveis de proteção legal são insuficientes ou inadequados e 10 milhões carecem de cobertura devido à não aplicação das leis e políticas em vigor.

Existem 4,1 milhões de trabalhadoras domésticas que podem efetivamente acessar seus direitos e proteções.

É o que afirma o relatório “Trabalho doméstico remunerado na América Latina e no Caribe, dez anos após a Convenção nº 189”, que analisa os avanços dos países da região desde 2011, ano em que a OIT aprovou a convenção sobre trabalhadoras e trabalhadores domésticos.

Nas palavras de Vinícius Pinheiro, diretor regional da OIT para a América Latina e o Caribe, “a elevada proporção de ratificações da Convenção nº 189 e os grandes avanços jurídicos e políticos revelam o alto compromisso dos países da América Latina e do Caribe com a melhoria das condições de trabalho das trabalhadoras domésticas remuneradas ”.

“Agora fica pendente a parte mais decisiva: conseguir sua aplicação para tornar realidade o trabalho decente no trabalho doméstico”, acrescentou Pinheiro.

Além de analisar os avanços legais em cada país e fazer recomendações, o relatório compila boas práticas. Entre elas, experiências sobre o registro de contratos escritos, mecanismos de acesso à justiça, diálogo social e negociação coletiva, acesso à seguridade social, programas de profissionalização do trabalho doméstico e campanhas de informação e conscientização.

“Incentivamos os países a adotar e adaptar essas boas práticas para garantir os direitos trabalhistas das trabalhadoras domésticas nacionais e estrangeiras, cujo trabalho é crucial para o funcionamento dos mercados de trabalho e da sociedade como um todo. A pandemia tornou isso mais claro do que nunca ”, disse o diretor regional da OIT.

Tempo de trabalho

Em 11 dos 24 países considerados, a jornada de trabalho das trabalhadoras domésticas é semelhante à normal. As principais lacunas estão na América Central e na República Dominicana, que estabelecem apenas um período mínimo de descanso diário.

No que diz respeito ao descanso semanal, em 21 países, o estabelecido para o trabalho doméstico é semelhante ao normal; e todos os países da região considerados no estudo reconhecem um período de férias remuneradas igual ou superior ao estabelecido para outros grupos de trabalhadoras e trabalhadores.

Na prática, apenas 4 em cada 10 trabalhadoras domésticas têm uma jornada de entre 35 e 48 horas semanais. Nos extremos, estão 3,8% das que trabalham mais de 60 horas semanais e 23,3% das que trabalham menos de 20 horas por semana.

Remuneração


Embora 22 dos 24 países reconheçam a proteção do salário-mínimo para as trabalhadoras domésticas, em três deles é inferior ao estabelecido para os demais grupos e, em dez, parte do pagamento pode ser feito em utilidades. Brasil, Chile e Peru proíbem o pagamento em utilidades e na Costa Rica essa remuneração em utilidades faz parte do salário-mínimo.

Na realidade, apesar de a situação ter melhorado em relação a 2012, em 2019, as trabalhadoras domésticas da América Latina e do Caribe recebiam uma renda mensal equivalente a 44,7% do valor recebido por outras pessoas assalariadas, e esta lacuna era ainda maior se for considerado unicamente as que trabalham na informalidade, visto que seu salário é 37,5% do das pessoas assalariadas.

De acordo com o relatório, essas lacunas podem ser resultado tanto de jornadas de trabalho muito curtas quanto de jornadas longas com remuneração por hora muito baixa, ou consequência da falta de proteção do salário-mínimo, da fixação de salários-mínimos menores para o trabalho doméstico ou falta de cumprimento.

Segurança social e proteção à maternidade

Na região da América Latina e do Caribe, 97,1% das trabalhadoras domésticas estão legalmente cobertas por pelo menos um tipo de seguridade social, mas apenas 9,8% têm todos os benefícios.
Na maioria dos países da região, a inscrição das trabalhadoras domésticas na previdência social é obrigatória, embora isto nem sempre garanta uma cobertura efetiva, as altas taxas de informalidade explicariam isso.

Em países como Argentina, Chile, Colômbia, Costa Rica e Uruguai, que permitem modalidades de seguro de acordo com as características do trabalho doméstico remunerado e que desenvolveram ações de fomento ao seguro, a informalidade foi reduzida.

A proteção legal da licença-maternidade é desfrutada por 97,4% das trabalhadoras domésticas. Apenas na República Dominicana este direito não é reconhecido, e somente em dois países —Granada e Jamaica— o período de licença das trabalhadoras domésticas é inferior ao que é reconhecido para as demais trabalhadoras.

Além disso, 80,7% das trabalhadoras domésticas têm direito a receber benefícios pecuniários durante a licença-maternidade, e somente em Honduras e na República Dominicana, elas estão excluídas desse direito.

Perfil das trabalhadoras domésticas


Cerca de 91,1% das pessoas que realizam trabalho doméstico remunerado na região são mulheres. Além de ser uma ocupação altamente feminilizada, o trabalho doméstico também é uma fonte importante de emprego para elas e, em 2019, uma em cada nove mulheres ocupadas (11,3%) era empregada doméstica.

Segundo os dados da CEPAL reunidos no estudo, a idade média das trabalhadoras domésticas aumentou notavelmente: de 34,5 anos em 2012 para 4,2 anos em 2017. Da mesma forma, seu nível de formação também melhorou consideravelmente: de 6,4 anos de estudo em média em 2000 para 7,4 anos em 2017.

Conforme afirma o relatório, as trabalhadoras domésticas da região que trabalham sem direito à aposentadoria são minoria. Em 2019, elas não representavam mais de 20% do total em nenhum dos países para os quais há dados disponíveis.

Na região, segundo o estudo, as mulheres indígenas e afrodescendentes estão sobrerrepresentadas no trabalho doméstico, com dados muito diferentes entre os países.

O documento também aponta que as trabalhadoras domésticas migrantes representam 35,3% do total de trabalhadoras migrantes, e o trabalho doméstico remunerado tem um peso maior para as mulheres migrantes do que para as nacionais.

Nesse sentido, o grande desafio é articular a legislação trabalhista e a legislação imigratória, visto que em alguns países com regulamentações restritivas à imigração, as trabalhadoras domésticas enfrentam dificuldades para obter um status regular e, portanto, encontram-se em situação de maior vulnerabilidade.

O trabalho decente para trabalhadoras domésticas é fundamental para eliminar as disparidades de gênero no mercado de trabalho.

Antes da pandemia, as trabalhadoras e os trabalhadores domésticos, 91,1% dos quais são mulheres em nossa região, representavam 6,8% do total da população economicamente ativa da região e 11,3% das mulheres economicamente ativas.

Para fechar as lacunas de gênero no mercado de trabalho da região, é essencial abordar o cumprimento dos direitos trabalhistas das trabalhadoras domésticas.

Por isso, em 17 de novembro, a OIT, conjuntamente com a Comissão Interamericana de Mulheres (CIM) da Organização dos Estados Americanos (OEA) e com o apoio da Fundação Pan-Americana para o Desenvolvimento (FUPAD), organizou uma mesa redonda para tornar visível o trabalho doméstico e os direitos das trabalhadoras domésticas.